quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Debate Royal!

Eu não estava querendo me expor MUITO com o assunto, mas me sinto na obrigação moral de fazê-lo. Vai ai um pouco de luz.

Amigos leigos, por favor, leiam, foi escrito para vocês. Amigos cientistas, por favor, não sejam detalhistas e puristas, eu escrevi para leigos e não para vocês, logo eu mesmo posso já ver vários de vocês criticando várias generalizações e explicações simplificadas, mas podem ler também e ajudar neste trabalho de conscientização geral. Isto é parte da sua função como cientista. Você deve orientações gerais à população.

Por que há laboratórios que fazem os testes in vitro?

Há testes que podem ser feitos in vitro, outros não. Por exemplo, se a sua pergunta for simples, do tipo:

1 – este medicamento mata as células do intestino? Posso facilmente colocar células intestinais em cultura, in vitro e adicionar o medicamento para avaliar se há morte ou não. Eu faço isso MUITO. Eu trabalho com moléculas que tem o potencial de inibir o crescimento de tumores. Eu quero saber o quanto elas inibem o crescimento tumoral, portanto tenho no laboratório células tumorais em cultura e testo estas moléculas sobre estas células, sem utilizar nenhum animal.

2 – ou se a sua pergunta for: este cosmético promove o aumento da expressão da proteína X, que está associada com rejuvenescimento? Facilmente se faz isso in vitro e se obtem a resposta. Colocam-se células da pele em cultura, tratam-se estas células com o cosmético e depois são feitos testes pra saber se tem mais da proteína X ou não.

No entanto, há perguntas que são muito importantes e que só podem ser respondidas com estudos feitos em animais. Por que? Porque existem muitos fatores envolvidos na resposta e não há como mimetizar todos estes fatores in vitro, nem NUNCA haverá, nem aqui, nem na Europa e nem nos EUA. Vamos ver alguns exemplos.

1 – Já descobri in vitro que a molécula que eu estava estudando mata células tumorais. Agora, eu preciso saber se ela faz isso quando o tumor está em um organismo vivo. Por que? Porque eu preciso saber se ao dar esta droga por via oral, por exemplo, ela não é degradada por enzimas do trato gastrointestinal; se é absorvida por este e vai parar na corrente sanguínea; se vai parar na corrente sanguínea toda de uma vez, podendo ser tóxica ou até letal ou se vai atingindo esta aos poucos; sendo aos poucos, se chega a apresentar concentração adequada ao redor do tumor; se na corrente sanguínea, sofre influência de alguma outra molécula que pode bloquear sua ação, porque se liga a ela não a deixando disponível para agir; se ela se distribui por igual pelo corpo ou se concentra toda em um único órgão; se ela atinge o tumor ou por algum motivo não passa por este; se ela é tóxica para algum órgão que eu não consegui prever; se ao passar pelo fígado ela é transformada e em que ela é transformada; se a molécula na qual ela foi transformada ainda é ativa e não tóxica; se a própria molécula e seus produtos de transformação são excretados pelos rins; se são excretados imediatamente a ponto de nem ficarem tempo suficiente no sangue ou se ficam circulantes por dias, o que me auxiliaria a definir dose e posologia.....e eu poderia continuar citando uma série de perguntas aqui que não podem ser respondidas in vitro e que são IMPORTANTÍSSIMAS, mas vamos para outro exemplo, porque eu estou empolgado.

2 – Você desenvolveu um medicamento que tem o potencial de diminuir a pressão arterial. A pressão arterial de forma muito grosseira, é a pressão exercida pelo sangue sobre os vasos sanguíneos. Há várias “pressões” em sentidos opostos que se contrapõem e o organismo regula finamente o volume de líquido que vai estar no vaso para manter a pressão adequada, o que é importante para o sangue circular por todos os vasos. A regulação do quanto de volume vai estar nos vasos e o calibre destes vasos, que também varia, depende de vários sistemas. Por exemplo, o FÍGADO produz uma molécula chamada angiotensinogênio, que fica circulante o tempo todo. Quando os RINS detectam que há perda de pressão, estes produzem uma enzima chamada renina, que converte o angiotensinogênio que o FÍGADO fez em angiotensina I. A angiotensina I atua sobre os vasos e consegue fazer com que se contraiam. Faz sentido, não? Já que a pressão está baixa, vamos diminuir o calibre dos vasos na tentativa de manter esta pressão (sim, aquela 12x8 que vc conhece). Esta ação integrada entre FÍGADO e RINS pode não ser suficiente, então os PULMÕES entram na jogada e produzem uma enzima chamada ECA (enzima conversora da angiotensina), esta por sua vez, converte a angiotensina I em angiotensina II e esta II tem um poder de promover contração dos vasos muito maior do que a I. Este é UM DOS mecanismos de manutenção da pressão arterial. UM DOS, dos mais simples e envolve FÍGADO, RINS, PULMÕES e CÉLULAS DOS VASOS e não é apenas UM TIPO de célula de cada um destes órgãos. Como estudar isso in vitro? Existem vários medicamentos que são inibidores da ECA, como captopril, enalapril, que muitos de vocês usam. Descobrir como funciona este mecanismo, desenhar moléculas (medicamentos) que atuem sobre este mecanismo de modo a favorecer quem sofre com hipertensão ou até mesmo hipotensão, SERIA IMPOSSÍVEL sem o uso de animais.

3 – Como testar uma vacina, como a para HIV que todos tanto querem, in vitro, sendo que deve haver a compreensão plena da atuação de todo o sistema imune, envolvendo vários tipos diferentes de linfócitos, macrófagos, células de Langerhans e outras e que estão estrategicamente distribuídas como que em trincheiras em linfonodos, nas mucosas, no baço, na medula?

4 – Como estudar memória, depressão, ansiedade em células que não aprendem nada e não expressam emoção? Como estudar os efeitos do envelhecimento sobre o cérebro senão acompanhando o envelhecimento de animais e analisando em detalhes tudo que está acontecendo em seus cérebros, ao mesmo tempo avaliando o efeito de atividade física e medicamentos sobre este “envelhecimento”? Poderíamos estudar o cérebro da sua avó que está perdendo a memória? Poderíamos, mas não resultaria em nada, porque não se pode estudar um único animal e mesmo que tivéssemos 100 avós, cada uma teria idade diferente, cada uma faria atividades de lazer diferentes, cada uma se alimentaria de forma diferente e sofreria estresse diferente. Como avaliar se o efeito observado é da intervenção medicamentosa ou do carinho a mais que uma recebe do neto e a outra não? Colocaríamos as 100 avós em cativeiro e as alimentaríamos com a mesma ração, expondo todas o mesmo tempo à luz solar e as colocaríamos pra correr numa rodinha de hamster todas ao mesmo tempo ao longo de 20 anos pra ver o que acontece com as que usam um medicamento em teste e outras que não? Os animais envelhecem mais rápido, portanto em 2 anos pode-se obter resultados finais que em humanos levaria décadas. Alguém já parou pra pensar quantos destes beagles não faziam parte de experimentos que estavam sendo desenvolvidos ao longo de anos, porque os resultados são lentos para alguns testes? Quanto de destruição patrimonial e para a ciência esta ação não pode ter causado? Será que a sua avozinha com Alzheimer não estava pra ser beneficiada com uma observação que vinha sendo feita já por anos com aqueles beagles e agora toda esta análise se perdeu?

Na minha tese de doutorado eu fiz 3,5 anos de experimentos in vitro e apenas nos últimos 2 meses usei camundongos para confirmar se o que eu achei in vitro valia in vivo. Por que não fiz tudo em animais? Porque SEMPRE evitamos ao máximo, porque além de TUDO é caro, mais trabalhoso, mais difícil de fazer e analisar e muitas vezes não dá as respostas que queremos. Sempre tentamos utilizar os sistemas mais simples possíveis. Só se usa animal quando não há outra forma de responder nossas perguntas e estas perguntas são avaliadas por comitês de ética para todos terem certeza de que não há mesmo outra forma de fazer o experimento. Inclusive o número de animais e tudo que vai ser feito com eles é estudado por estes comitês e discutido.

Os laboratórios que fazem in vitro, não fazem isso porque são bonzinhos. Fazem isso porque têm perguntas que podem ser respondidas in vitro e ainda se aproveitam de vocês zooxiitas usando este marketing falso, querendo dizer que evitam o uso de animais, porque são contra. Não usam animais simplesmente porque não precisam e nem teriam como usar, porque suas perguntas são respondidas por outros sistemas. NÃO existe isso de que algum laboratório desenvolveu um sistema que agora estuda in vitro o que antes era feito em animais. O que pode e precisa ser feito in vitro é feito in vitro; o que pode e precisa ser feito em animais é feito em animais. Vocês zooxiitas estão sendo usados como massa de manobra dos marketeiros destas empresas. É igual quando vemos na embalagem de um picolé de frutas a informação “não contem gordura trans”. CLARO que não contem!!! É um picolé de frutas e não contem gordura NENHUMA, porque raios teria trans? Jogada de marketing, porque os marketeiros sabem que tem um monte de gente que vai comprar mais se tiver escrito este tipo de coisa. Agua mineral, SEM GORDURA TRANS.

Meus cosméticos são desenvolvidos sem testes em animais. CLAAAAAAAARO. Que tipo de testes precisam fazer em animais? Nenhum. Tudo dá pra fazer in vitro. Se aproveitam de vocês.

Mas na Europa e nos EUA existem movimentos contra experimentação em animais. CLARO!!! Morei anos nos EUA e posso aqui listar muitas porcarias que existem lá, assim como na Europa. Gente ignorante que protesta por emoção sem saber do que está falando existe em todos os continentes.

Espero que isto tenha esclarecido ao menos parcialmente, de alguma forma, porque se faz experimentação SÉRIA E CUIDADOSA em animais e vai se continuar fazendo.


Resposta:

[Elisa, UFF]

Isso que ele falou imagino que não seja novidade pra maior parte das pessoas e é o argumento que tenho visto ser usado por todo mundo que ficou puto com a história dos beagles. Só que, segundo as reportagens que eu li, eles eram usados em testes de cosméticos, e não vi ninguém abordar esse assunto até agora. Existem várias empresas gigantes de cosméticos, como Maybelline e Johnson's, que testam em animais. Mas outras empresas igualmente gigantes, como Nivea e Boticário, não testam em animais e isso não as impede de ter produtos de igual qualidade, não raro até superior, nem de lançar com frequência coisas inéditas, o que sugere que elas não estão simplesmente copiando de quem testa em animais, e sim desenvolvendo pesquisas próprias. Realmente não sei o que explica isso, adoraria ver alguém da área tocar nesse assunto ao invés de falar pela milésima vez o óbvio, que remédios são complexos demais pra teste in vitro. Mas, como leiga, a comparação entre essas empresas e suas posturar éticas só pode me levar a concluir que é perfeitamente possível produzir produtos cosméticos de qualidade sem torturar animais no processo.

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