quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Avólio torturou SIM!

Coronel Avólio disse em matéria hj do Globo de que não torturou.
Depoimento de Cid dizendo: É MENTIRA!

Que a nossa memória nos defenda das torturas do futuro!

"Avólio. [...]
Revoltado com o fato de um médico estar me atendendo, ele dizia que eu deveria “morrer como um porco, sangrando”. Para tal, assegurava, bastava que me pendurassem de cabeça para baixo.
[...]
no pau-de-arara, ele fazia galhofas:

- Deve estar faltando energia, porque ele não acende.

[...]
Mas, apesar disso, não lhes tenho ódio pessoal. E se, aqui, lembro esses fatos é porque quanto mais o país conhecer o que se passou naquele período, mais anticorpos estaremos criando na sociedade para que eles não se repitam. É isso – e só isso – o que me fez prestar este depoimento.

(texto publicado no "Globo" em 26/5/1995)"




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Texto na íntegra:


Como muita gente reclamou que não conseguia compartilhar este texto, eu o posto de novo, seguindo os ensinamentos de Fernando Stern para que ele possa ser compartilhado.

O jornal "O Globo" de hoje traz uma matéria sobre depoimento prestado pelo coronel Armando Avólio Filho ao Ministério Público Federal. Nele, Avólio acusa outros militares de terem torturado presos políticos, admite que presenciou torturas no DOI-Codi, mas afirma que ele próprio nunca torturou alguém.
É mentira.
Avólio me torturou em abril de 1970. E não só a mim. Dezenas de outros presos foram, também, torturados por ele.
Em 1995, Avólio era adido militar brasileiro na Grã-Bretanha e foi denunciado pelo grupo Tortura Nunca Mais. Ele se dizia inocente. Na ocasião, eu trabalhava no "Globo" e me ofereci para redigir um artigo, na primeira pessoa, atestando que Avólio me torturara.
A sugestão foi aceita e o texto foi publicado na edição de 26/5/95.
Avólio foi, então, exonerado e passado para a reserva remunerada.
Reproduzo o artigo abaixo.

“Um dos mais cruéis torturadores”
Cid Benjamin

Alto, forte, quase sempre de óculos escuros e camisetas justas, que realçavam seus bíceps musculosos, o tenente Avólio não se preocupava em disfarçar a extrema vaidade. Até seu codinome, suspeito, a denunciava: Apolo, o deus grego da beleza. Mas Avólio tinha outra característica: era um dos mais cruéis torturadores do DOI-Codi no início dos anos 70.

Eu o conheci na mesma noite em que fui preso, a 21 de abril de 1970. Como estava ferido na cabeça por dezenas de coronhadas e perdia muito sangue, chegou a ser aventada a hipótese de me levarem primeiro para o Hospital Central do Exército. Mas, como de praxe, venceram os “duros” e fui direto para o DOI-Codi. O tenente-médico Amílcar Lobo foi chamado e, lá pelas tantas, as torturas foram suspensas para que eu levasse 15 pontos na cabeça. A frio, naturalmente. Mas, para quem estava no pau-de-arara, levando choques elétricos em todo o corpo, não deixou de ser um alívio. Foi aí que percebi, pela primeira vez, a existência de Avólio. Revoltado com o fato de um médico estar me atendendo, ele dizia que eu deveria “morrer como um porco, sangrando”. Para tal, assegurava, bastava que me pendurassem de cabeça para baixo.

Mais tarde, já de madrugada, numa pausa das torturas, Avólio me algemou os pulsos numa madeira rente ao chão e quebrou meia dúzia de vassouras nas minhas costas, enquanto nos xingávamos mutuamente. Estava inteiramente fora de si. Eu, apesar de tudo, não podia deixar de festejar sua histeria. Enquanto ele descarregava seu ódio, eu não estava pendurado, levando choques ou sendo afogado. Não deixava de ser um lucro.

Nos dias seguintes, Avólio se destacou pelo ódio que me dedicava e que não fazia questão de esconder. Um de seus passatempos prediletos era amarrar fios em meu corpo e ligar suas extremidades na tomada. Enquanto eu, nu e amarrado, rolava pelo chão ou corcoveava no pau-de-arara, ele fazia galhofas:

- Deve estar faltando energia, porque ele não acende.

O então tenente e hoje coronel Avólio não foi o único militar que se dedicou a torturar presos políticos. Ao contrário, aquela engrenagem produziu uma infinidade de avólios. Eles são responsáveis por assassinatos e por traumas em, talvez, milhares de pessoas que até hoje estão marcadas pela tortura. Mas, apesar disso, não lhes tenho ódio pessoal. E se, aqui, lembro esses fatos é porque quanto mais o país conhecer o que se passou naquele período, mais anticorpos estaremos criando na sociedade para que eles não se repitam. É isso – e só isso – o que me fez prestar este depoimento.

(texto publicado no "Globo" em 26/5/1995)



Fonte: Cid Benjamin
https://www.facebook.com/cid.benjamin/posts/10152264731474228?stream_ref=5

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