Funções da coordenação das unidades do SUAS
Problematizar e propor reflexões sobre os “bastidores” das funções do profissional que ocupa o cargo de coordenação nas unidades que ofertam os serviços socioassistenciais são os objetivos deste texto.
As atribuições deste cargo nos Cras, Creas, Centro pop, unidades de Acolhimento Institucional para crianças e adolescentes, estão elencadas em todos os cadernos de orientações técnicas das respectivas unidades – se você não conhece ou quer rever, acesse:Atribuições Coordenador CRAS CREAS Centro POP
Quanto ao cargo e sua ocupação
O cargo de coordenação está previsto na NOB/RH-SUAS 2006, o qual compõe a equipe das unidades e deve ser, assim como os demais trabalhadores, concursados. Este é um ponto central, porque ao regulamentar a composição da equipe, o SUAS aponta as diretrizes para a desprecarização dos vínculos trabalhistas e visa romper com a rotatividade de profissionais, descontinuidade dos serviços e com campos fluídos dotados de interesses meramente políticos e pontuais.
No entanto, passados dez anos do Sistema Único de Assistência Social – SUAS e algumas atualizações na Legislação e nos marcos legais – como Exemplo: Resolução CNAS nº 17/2011 e NOB RH-SUAS comentada, o cenário é ainda carregado da velha política e do despreparo técnico daqueles à frente da Assistência Social nos Municípios.
Acredito que a forma de admissão é a gênese de muitos problemas na composição das equipes. Não pretendo me alongar neste ponto, mas acho imprescindível ilustrar este parágrafo com trechos de duas Leis Municipais (disponíveis na internet) que cria os cargos de coordenação do Cras e Creas:

A qualidade técnica dos serviços ofertados e a persistente caminhada nos trilhos da PNAS e da ética estão também atreladas ao desempenho do coordenador. Como esta compreensão desencadeou este texto, vou me ater mais a estes aspectos, ou seja, às habilidades técnicas e interpessoais do profissional que exerce o cargo de coordenação no SUAS.
Quais são estes profissionais? A Resolução CNAS 17/2011 cita nove categorias que poderão compor a gestão do SUAS: Assistente Social; Psicólogo; Advogado; Administrador; Antropólogo; Contador Economista; Economista Doméstico; Pedagogo; Sociólogo e Terapeuta ocupacional (CNAS, Art.3º) – Por que ainda os Municípios elaboram Editais (quando elaboram e há concurso) e colocam que apenas pedagogos ou administradores, por ex., poderão pleitear a vaga de coordenador, e fica por isso mesmo?
A gestão do trabalho, se bem implementada, será a grande aliada do gestor ao definir a (s) categoria (s), de acordo com o que já está regulamentado, para cada cargo de gestão na efetivação do SUAS no Município.
Responsabilidades e compromissos qualitativos inerentes ao cargo
Uma porcentagem significativa das fragilidades operacionais, técnicas e interpessoais enfrentadas pelos profissionais do SUAS carecem de intervenções por parte do coordenador – muitas vezes, as consequências de sua falta de habilidade/perfil para o cargo é que agrava a situação no campo de trabalho.
Tenho inúmeros exemplos reveladores dessas situações (contatos via e-mail; supervisões técnicas e outras experiências, como a que relato a seguir:
Em uma palestra realizada no VI Encontro de Gestores Municipais da Assistência social da Bahia, onde eu e mais duas profissionais proferimos sobre “Teorias e práticas no SUAS: reflexões e desafios para a atualidade” experenciei desdobramentos desses problemas. Ao longo do debate, após algumas perguntas, eis que surge uma bem afoita e direta: “os que vocês têm a dizer quando o trabalho não acontece porque as duas profissionais, assistente social e psicóloga, nem se falam”? a reação da plateia foi entre “dar de ombros”, burburinhos e alguns risos, como se dissessem: quem é essa soltando essa pérola aqui? Pra mim, a pergunta dessa profissional tinha todo sentido. Mas a mesa também tratou de adiantar os pontos e dizer bem educadamente que ali não era lugar para tratar dessas questões rotineiras. Pelo andar da hora, foi impossível retomar a palavra e acho que se tivesse a oportunidade eu não teria falado algo significativo, tamanho meu sobressalto pela reação da plateia e da mesa. O que me fez pensar que a proposta da discussão talvez não tivesse alcançado o esperado. Mas o ato de fazer a pergunta pode suscitar alguma solução para aquela profissional, porque refletir sobre o trabalho ela já estava se permitindo fazer! Refleti o quanto aquela pergunta era reveladora das consequências da precarização dos vínculos trabalhistas e das relações de trabalho no dia a dia. Uma pena que ninguém ou poucos, a ESCUTARAM.
A coordenação, além dos desafios teóricos, metodológicos e operacionais/administrativos inerentes ao cargo, a habilidade para gerir pessoas é o maior deles. Não é fácil gerenciar processos de trabalhos que contam com uma diversidade de profissionais, categorias e serviços, além, claro, com as questões políticas.
O sujeito (a pessoa, o indivíduo, o cidadão) é o ponto central dos nossos desafios, tarefas e fragilidades. Eles perpassam tudo: equipe técnica; profissionais das outras unidades; profissionais das demais políticas públicas e outros setores, e os sujeitos destinatários da assistência social.
Não sei se me faço entender, mas quero dizer que o coordenador, estando no cargo através de concurso ou por precarização de vínculo trabalhista, ele terá que se a ver com as inúmeras facetas das relações interpessoais. E tenho certeza que não estou falando bobagem ou cometendo injustiças com profissionais, porque é incontável o número de profissionais se queixando das relações de trabalho (tenho relatos de pessoas adoecidas), e do travamento de vários projetos ou cerceamento da atuação, devido conflitos entre os técnicos de uma mesma unidade ou entre um unidade e outra.
A coordenação é a ponte entre o trabalho técnico e o trabalho da gestão. Ele transita entre vários interesses, reivindicações e por isso é preciso ter posicionamento para escutar e tentar media-los da melhor maneira para um coletivo, possibilitando o andamento ou redirecionamento do trabalho.
Para tentar fechar este texto cheio de pontos que carecem mais desdobramentos, destaco a seguir, alguns aspectos que prejudicam a atuação do coordenador e aponto um caminho possível de ser trilhado para qualquer profissional:
Pontos prejudiciais:
- Entendimento equivocado sobre cargo e liderança. Um dos equívocos e alienação recorrentes é atrelar um poder ao cargo, tomando-o como condição privilegiada em relação aos demais. Somos todos proletários!
- Omissão de informações e centralidade do conhecimento (intenção de manter o cargo, medo de perdê-lo – porque acredita que o cargo é seu). Grande problema da falta de concursos públicos para este cargo. O Conceito de Campo de Bourdieu me ajuda a elucidar essas relações;
- Autoritarismo;
- Falta de habilidade para enfrentar problemas/conflitos;
- Tomar projetos e ações como resultados individuais e não provenientes do trabalho em equipe;
- Estar onde não se gosta e fazer o que não se gosta;
- Desconhecimento da PNAS/SUAS;
- Parcialidade nas relações de trabalho;
- Tomar o tempo de experiência como conhecimento acabado e o mais adequado;
Trilhas para uma coordenação mais assertiva
- Entendimento da liderança como circunstancial (Cortella, 2014);
- Fazer o que gosta – no mínimo sentir apreço pelas lutas e causas pela efetivação da política pública;
- Escutar e escutar mais um pouco;
- Dialogar;
- Autoridade;
- Sensibilidade;
- Conhecimentos inerentes ao cargo considerando a PNAS e todos os seus desdobramentos;
- Entender e repassar que nem todas relações de trabalho serão levadas para a vida pessoal;
- Imparcialidade nas relações quanto ao direcionamento e mediação de conflitos; as desavenças, aquelas que afetam a execução dos trabalhos, necessariamente, deverão ser pautas e reuniões;
- Posicionamento suficiente para suportar as frustrações e insatisfações manifestadas pelo grupo;
- Saber que nunca se sabe o suficiente;
Como colocar tudo isso em prática?
Comece com o mais direto dos tópicos, implantando e mantendo sistematicamente reuniões administrativas e técnicas com toda a equipe, espaço para dialogar e reinventar direções. Os demais pontos vão se mostrando aos poucos e exigindo novos posicionamentos e aprendizagens.
As reuniões periódicas de planejamento com toda a equipe de referência do CRAS, entre profissionais de nível superior e coordenador, deve ser parte do processo de trabalho do CRAS, sendo imprescindível para a garantia da interdisciplinaridade do trabalho da equipe. Além disso, cabe ao coordenador detectar necessidades de capacitação da equipe, redirecionar, junto com o grupo, objetivos e traçar novas metas a fim de efetivar o CRAS como unidade pública que possibilita o acesso aos direitos socioassistenciais nos territórios. Estes momentos, que devem ser preferencialmente semanais, são ainda importantes para possibilitar a troca de experiências entre os profissionais. (…) Os profissionais de nível médio também devem participar de reuniões de equipe, principalmente aqueles que desenvolvem funções relacionadas à oferta de serviços de convivência e fortalecimento de vínculos no CRAS. (Caderno de Orientações CRAS/2009, pág 41).
Tenha como meta inspirar as pessoas e com certeza o trabalho ficará muito mais efetivo e fará menos mal à saúde mental dos trabalhadores!
Aguardarei os comentários de vocês e quem sabe não podemos continuar com mais Posts nesta categoria!
Obrigada pela companhia!
SITE: Psicologia no SUAS
LINK: https://craspsicologia.wordpress.com/2016/01/11/funcoes-da-coordenacao-das-unidades-do-suas/
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