sábado, 29 de junho de 2013
Egípcios agradecem a manifestantes brasileiros por protestos inspiradores
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Egípcios na Praça Tahrir, hoje (29 de junho). Imagem: ROARMag |
O grupo
"Comrades from Cairo" agradeceu, em carta aberta, aos brasileiros e
turcos pelo que chamaram de "protestos inspiradores".
Comentaram que,
apesar de Brasil, Turquia e Egito apresentarem realidades sociais
diferentes, a luta de tais países é unida pelo fato de que "nós todos
temos sido condenados por círculos fechados que desejam que se perpetue
esta falta de visão de qualquer bem para as pessoas".
Comentaram a concepção que receberam do governo brasileiro coetâneo: "No
Brasil, um governo enraizado numa legitimidade revolucionária provou
que seu passado é somente uma máscara usada enquanto seus parceiros da
mesma ordem capitalista exploram as pessoas e a natureza".
A carta foi marcada por uma feição aparentemente revolucionária, anticapitalista, internacionalista, liberal e anti-opressiva.
Aparentemente,
os componentes do grupo egípcio não estão cientes da abrangência e da
amplitude que os levantes brasileiros atingiram, haja vista a citação
enfocada no Movimento Passe Livre, o qual, há tempo razoável, abandonou
as manifestações, além de não ter envolvimento - e ter declarado,
inclusive, oposição - com as motivações da maior parte da população
brasileira manifestante.
Qual é a sua posição a respeito? Leia a íntegra da carta abaixo.
Carta aberta do coletivo ativista egípcio "Comrades from Cairo'
A você do lado em que lutamos,
30 de Junho irá marcar um novo estágio de rebelião para nós,
construindo em cima do que iniciamos nos dias 25 e 28 de Janeiro de
2011. Desta vez, nós nos rebelamos contra o reinado da Irmandade
Muçulmana, que trouxe apenas mais das mesmas formas de exploração
econômica, violência policial, torturas e mortes.
Referências à vinda de "democracia" não têm relevância quando não
existe a possibilidade de se viver uma vida decente, sem sinais de
dignidade e um padrão de vida decente. Os pedidos por legitimidade
através de um processo eleitoral nos distraem da realidade de que no
Egito, nossa batalha continua porque vivemos a perpetuação de um regime
opressivo que mudou sua face, mas mantém a mesma lógica de repressão,
austeridade e brutalidade policial. As autoridades mantêm a mesma falta
de qualquer prestação de contas para o público, e as posições de poder
se traduzem em oportunidades de conquistar riqueza e influências
pessoais.
O dia 30 de Junho renova o grito da revolução: "As pessoas querem a
queda do sistema". Nós vislumbramos um futuro governado nem pelo
autoritarismo e capitalismo da Irmandade, nem por um aparato militar que
mantêm o controle da vida política e econômica, nem pelo retorno das
velhas estruturas da era Mubarak.
Embora nossas redes ainda sejam fracas, nós desenhamos esperança e
inspiração dos recentes levantes, especialmente na Turquia e no Brasil.
Cada um nasceu de realidades políticas e econômicas diferentes, mas nós
todos temos sido condenados por círculos fechados que desejam que se
perpetue esta falta de visão de qualquer bem para as pessoas. Nós nos
inspiramos na organização horizontal do Movimento Passe Livre, iniciado
em 2003 na Bahia, Brasil; nós nos inspiramos nas assembleias públicas
lotadas que vemos por toda a Turquia.
No Egito, a Irmandade insiste em acrescentar o viés religioso a todo o
processo, enquanto a lógica de um neo-liberalismo localizado acaba com
as pessoas. Na Turquia, uma estratégia de crescimento agressivo do setor
privado se traduz em regras autoritárias, a mesma lógica da brutalidade
policial como arma primária para oprimir a oposição e qualquer
tentativa de outras alternativas. No Brasil, um governo enraizado numa
legitimidade revolucionária provou que seu passado é somente uma máscara
usada enquanto seus parceiros da mesma ordem capitalista exploram as
pessoas e a natureza.
Essas lutas recentes compartilham de batalhas muito mais antigas dos
Curdos no Oriente Médio e dos indígenas na América Latina. Por décadas,
os governos Turco e Brasileiro tentaram (e falharam) calar estes
movimentos de luta pela vida. Sua resistência contra a repressão do
Estado foi a precursora desta nova onda de protestos que se espalharam
pela Turquia e pelo Brasil. Vimos uma urgência em reconhecer a
profundidade de nossas lutas e procurar formas de amplificarmos nossas
vozes em novos lugares, vizinhanças e comunidades.
Nossas lutas compartilham um potencial de se opor ao regime global de
Estados-Nações. Na crise e na prosperidade, o Estado continua a
desapropriar e privatizar tudo para preservar e expandir a riqueza e o
privilégio daqueles que estão no poder.
Nenhum de nós está lutando isolado. Nossos inimigos são os mesmos do
Bahrein, Brasil, Bósnia, Chile, Palestina, Síria, Turquia, Curdistão,
Tunísia, Sudão, Saara, e Egito. E a lista continua... Por todo o lado
eles nos chamam de criminosos, vândalos, arruaceiros e terroristas. Nós
não estamos lutando só contra a exploração econômica, a violência
policial descarada e um sistema jurídico ilegítimo. Não são por direitos
ou reformas cidadãs que estamos lutando.
Nós nos opomos ao Estado-Nação como uma ferramenta centralizada de
repressão, que possibilita às elites locais sugarem nossas vidas e
poderes globais para reter sua dominação sobre o dia-a-dia das pessoas.
Nós não estamos requisitando a unificação ou equalização de nossas
várias batalhas; mas a estrutura de autoridade e poder contra qual nós
devemos lutar, desmantelar, e trazer abaixo é a mesma. Juntos, nossa
luta é mais forte.
Nós queremos a queda do Sistema."
Tradução de Movimento Pró-Corrupção.
Marcos Camponi.
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