domingo, 30 de junho de 2013

O poeta político Galeano em 3 atos!

Ato número 1:
De onde vem as respostas?

"Os JOVENS multiplicam-se, levantam-se, escutam: O QUE LHES OFERECE A VOZ DO SISTEMA? O sistema fala uma linguagem surrealista:
- propõe evitar os nascimentos nestas terras vazias;
- diz que faltam capitais em países onde estes sobram, mas são desperdiçados;
- chama de ajuda a ortopedia deformante dos empréstimos e à drenagem de riquezas que os
investimentos estrangeiros provocam;
- convoca os latifundiários a realizarem a reforma agrária, e a oligarquia para pôr em prática a justiça social.

A LUTA DE CLASSES não existe - decreta-se -, mais que por culpa dos agentes forâneos que a fomentam; em troca existem as classes sociais, e se chama a opressão de umas por outras de estilo ocidental de vida. As expedições criminosas dos marines têm por objetivo restabelecer a ORDEM e a PAZ SOCIAL, e as ditaduras fiéis a Washington fundam nos cárceres o ESTADO DE DIREITO, proíbem as greves e aniquilam os sindicatos para proteger a LIBERDADE de trabalho.

Tudo nos é proibido, a não ser cruzarmos os braços? A POBREZA não está escrita nos astros; o SUBDESENVOLVIMENTO não é fruto de um obscuro desígnio de Deus. As CLASSES DOMINANTES põem as barbas de molho, e ao mesmo tempo anunciam o inferno para todos. De certo modo, a DIREITA TEM RAZÃO quando se identifica com a TRANQUILIDADE e a ORDEM;
- é a ordem, de fato, da cotidiana humilhação das maiorias, mas ordem em última análise;
- a tranqüilidade de que a injustiça continue sendo injusta e a fome faminta.

Se o futuro se transforma numa caixa de surpresas, o conservador grita, com toda razão: “Traíram-me.” E os ideólogos da impotência, os escravos, que olham a si mesmos com os olhos do dono, não demoram a escutar seus clamores."
(Veias Abertas da América Latina)





Ato número 2:
"A fome/2

Um sistema de desvinculo: Boi sozinho se lambe melhor..,
O próximo, o outro, não é seu irmão, nem seu amante. O outro é um competidor, um inimigo, um obstáculo a ser vencido ou uma coisa a ser usada. O sistema, que não dá de comer, tampouco dá de amar: condena muitos à fome de pão e muitos mais à fome de abraços."
(Livro dos abraços)

 

Ato número 3:

"Os sonhos esquecidos

Helena sonhou que deixava os sonhos esquecidos numa ilha. Claribel
Alegria recolhia os sonhos, os amarrava com uma fita e os guardava bem
guardados. Mas as crianças da casa descobriam o esconderijo e queriam vestir os
sonhos de Helena, e Claribel, zangada, dizia a eles:
— Nisso ninguém mexe.
Então Claribel telefonava para Helena e perguntava:
— O que eu faço com seus sonhos?"
(Livro dos abraços)

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